"A vitória brilhará àquele que tímido ouse". Agostinho da Silva

Terça-feira, 16 de Dezembro de 2008
Concorrência no Sector Bancário
O fundamento da concorrência no sector bancário tem sobretudo interesse para as sociedades democráticas. A concentração do poder económico e, em particular no mercado bancário, constitui um perigo para a democracia e para as economias de mercado. Como refere Carlos Costa Pina, em Portugal mais de 70% do mercado financeiro é controlado pelas primeiras 4 ou 5 empresas que nele actuam e nalguns casos um número inferior de empresas controla mesmo uma quota de mercado superior. Este facto ilustra bem a importância da concorrência e ao mesmo tempo o perigo que ela constitui.
Importa primeiramente fazer a distinção entre regulação e concorrência. A concorrência visa assegurar a melhor repartição possível dos bens através dos mecanismos do mercado. Em Portugal, a origem do direito da concorrência remonta a 1983, com uma forte e preponderante influência do direito comunitário da concorrência. Já o sistema regulatório tem uma vertente e um objectivo distinto que admite a iniciativa privada e estabelece um regime de mercado condicionado, compreendo limitações à liberdade de acesso e um controlo dos serviços prestados na produção dos investimentos e de muitos outros factores. A regulação tem um alcance específico, enquanto a concorrência tem um alcance geral. O objectivo primordial da regulação é a criação de uma estrutura de mercado que permita manter a concorrência, ou seja uma regulação estrutural. Onde existir um mercado fortemente regulado, o nível de concorrência será menor.
Mas, a concorrência bancária não se pode limitar à análise da actividade concorrencial das instituições bancárias próprio sensu, sob pena de insuficiência dos resultados por análise defeituosa do mercado, devendo englobar a análise concorrencial das restantes instituições de crédito bem como de algumas sociedades financeiras, empresas de investimento e até mesmo seguradoras quando exerçam actividades contíguas às das instituições bancárias.
Anteriormente a actividade bancária era fortemente regulamentada, no entanto a liberalização do mercado interno e o consequente acréscimo da concorrência em relação às instituições financeiras modificou o seu enquadramento. Efectivamente, a constituição de uma união económica e monetária teve necessariamente um triplo alcance no que concerne à concorrência. Em primeiro lugar, porque proporcionou um aumento de “competição” entre as instituições bancárias, resultante também da inexistência de obstáculos cambiais. É também de salientar a existência de rivalidade entre as ordens jurídicas, no sentido máximo de favorecimento das suas instituições nacionais, nomeadamente, no campo fiscal. Por fim, também subjaz a concorrência entre ordenamentos regulatórios aplicáveis as diferentes instituições financeiras.
Não obstante o grau de imperfeição do mercado único no sector bancário, a sua congeminação com a criação da união económica e monetária teve um forte impacto na construção das estratégias concorrenciais das instituições.
O ordenamento comunitário coexiste com o ordenamento nacional sendo a fronteira estabelecida pela noção chave “ afectação do comércio entre os estados membros”, não se verificando este requisito, não se encontra no âmbito de incidência do ordenamento comunitário aplicando-se exclusivamente o nacional.
Cumpre agora analisar a concorrência no sector bancário à luz do direito nacional.
O Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), o Decreto-Lei n.º 298/92, regula as matérias de acesso ao mercado, dependendo a constituição de qualquer instituição de crédito de autorização a conceder pelo Banco de Portugal, que analisará todas as situações casuisticamente (art. 16.º). E, já nos artigos 87.º e 88.º, são estabelecidas excepções à concorrência no sector bancário.
Segundo o Dr. Carlos Lobo, do ponto de vista da concorrência importa ainda averiguar art. 73.º que consagra os deveres gerais respeitantes às relações com clientes e o dever de informação procurando garantir elevados níveis de competência técnica em condições apropriadas de qualidade, eficiência, diligência, neutralidade, igualdade, discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhe estão confiados e informações sobre remunerações oferecidas pelos fundos recebidos e sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos provocados por aqueles”.
Mas, no que concerne ao art. 87.º:
O seu número 1 estipula o princípio da sujeição das actividades das instituições de crédito e das associações empresariais, e por força do art. 195.º das sociedades financeiras, à legislação de defesa da concorrência. Já o seu número 2 vem consagrar uma excepção a este princípio: ao estipular não serem restritivos da concorrência os acordos legítimos entre instituições de credito e as práticas concertadas que tenham por objecto a participação em emissões e colocações de valores mobiliários ou instrumentos equiparados e a concessão de créditos ou outros apoios financeiros de elevado montante a uma empresa ou conjunto de empresas. Por fim, o seu número 3 define igualmente que na aplicação da legislação da defesa da concorrência às instituições de crédito e às suas associações empresariais ter-se-ão sempre em conta os bons usos da respectiva actividade nomeadamente no que respeita as circunstâncias de risco ou solvabilidade.
A justificação para a existência destas excepções prender-se-á com a repartição do risco entre as diversas instituições de crédito, numa operação que trará efeitos muito positivos para o desenvolvimento da economia, para a estabilização do mercado de valores. Constituirá per si um estímulo para o subsector do qual fazem parte as próprias instituições de crédito.
Por outro lado, o art. 88.º prevê a obrigatoriedade da Autoridade da concorrência solicitar ao Banco de Portugal e, se for caso disso, à comissão de mercado de valores mobiliários, um parecer quando as arguidas num processo de contra ordenação por violação das regras da concorrência forem instituições de crédito, sociedades financeiras ou as suas associações empresariais.
 No que concerne ao direito nacional da concorrência, temos o regime de tutela da concorrência que consta da lei 18/2003 de 11 de Junho que regula as práticas lesivas da concorrência. Aí estão consagradas através de acordos, práticas concertadas e decisões de associações de empresas e que tenham por objecto impedir falsear ou restringir a concorrência, nomeadamente pela fixação de preços, limitações à produção abuso de posição dominante e do qual não são excluídas as instituições de crédito nem sociedades financeiras.
Os actos que revelem práticas lesivas da concorrência são proibidos pelo art. 4.º n.º 1 podendo, no entanto, em certos casos ser justificadas ao abrigo do art. 5.º do mesmo diploma.
De facto, operações como as de concentração de empresas têm de ser previamente notificadas à Autoridade da Concorrência quando preencham as condições do art. 9.º da LDC, quota superior a 30% do mercado respectivo ou volume de negócios do conjunto de empresas superior a 150 milhões de euros, desde que o volume de negócios realizado em Portugal de pelo menos duas dessas empresas seja superior a 2 milhões de euros. Por fim, a aquisição de participações em empresas não financeiras, quando não proibida pelo art. 101.º do RGICSF, fica isentada dos procedimentos relativos à notificação de concentrações estipulados na lei 18/2003, de 11 de Junho, de acordo com a al. c) do n.º 4, do art. 8.º. Isto é, as instituições de crédito não poderão deter directa ou indirectamente numa sociedade por prazo seguido ou interpolado, superior a 3 anos, participação que lhe confira mais de 25% dos direitos de votos da sociedade participada. Exceptuam-se deste regime as participações em outras instituições de crédito sociedades financeiras, sociedades de serviços auxiliares, seguradoras sociedades gestores de fundos de pensões artigo 101.º nº3 do RGICSF.
Para além dos requisitos supra mencionados relativamente às operações de concentração de empresas, haverá ainda a considerar o art. 35.º do RGICSF, que requer uma autorização prévia ao Banco de Portugal para fusão e cisão de instituições de crédito entre si ou com sociedades financeiras (esta autorização não decorre da necessidade de análise dos efeitos concorrenciais de uma operação de concentração, mas de objectivos e regras prudenciais inerentes à função do Banco de Portugal como autoridade de supervisão).
Estas disposições não substituem o regime geral da concorrência.
Em conclusão, há autores que defendem a criação de um regime de concorrência específico e uma entidade própria que regule a concorrência no sector bancário. Porém, tal como sustenta Jorge Mendes, será mais vantajosa a manutenção do actual regime concorrencial único e de sujeição à lei da concorrência e com a manutenção a cargo da Autoridade da Concorrência da competência para instruir os processos de práticas restritivas da concorrência. Deverá ser com maior intervenção futura das autoridades de supervisão bancária? Fica a questão em aberto.
 Margarida Lopes
Joana Correia


publicado por Margarida Balseiro Lopes às 04:18
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Sexta-feira, 22 de Agosto de 2008
Ainda reclamam de Bolonha...

"Um colégio de raparigas localizado em Sidney está a testar a utilização de telemóveis, iPods e Internet durante os exames. Um dos responsáveis acredita que este método irá revolucionar a realização dos exames de acesso ao Ensino Superior no país."

 

Vou já reencaminhar a notícia para a divisão académica da FDL...



publicado por Margarida Balseiro Lopes às 18:28
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Terça-feira, 8 de Julho de 2008
Aborto: uma questão jurídica ou moral?

O aborto, que consiste interrupção provocada da gravidez, é tratado no Código Penal, nos artigos 140º e seguintes, dos crimes contra a vida intra-uterina.
Cumpre saber se esta é uma questão jurídica, fundamental para a convivência da sociedade e para a prossecução do bem comum, ou se se trata de uma questão da vida moral, da ordem de consciências, visando o aperfeiçoamento dos indivíduos, orientando-os para o bem.


A questão do aborto, em meu entender, remete para o artigo 24º da Constituição, segundo o qual a vida humana é inviolável, uma pedra basilar num Estado de Direitos Humanos. Ainda que os artigos 66º e 68º do Código Civil só atribuam personalidade jurídica após o nascimento completo e com vida, é inegável que há vida humana, quando falamos de nascituros. Desde a sua concepção emerge um ser dotado de uma estrutura e de uma dinâmica humana autónoma, embora funcionalmente dependente da mãe. O nascituro é considerado como um bem juridicamente protegido, tanto mais que o legislador no artigo 24º CRP não distinguiu a vida extra-uterina. Aliás o Código Civil dedica-lhes alguns artigos, o 952º, 2033º, 1878º, 2240º/2. Tal não significa que deva ser dispensada uma tutela jurídico-penal idêntica em todas as fases da vida, e que tal tutela seja absoluta, como disso é exemplo o regime da interrupção voluntária da gravidez. No entanto, por se tratar de um bem protegido juridicamente, esta é uma questão jurídica, que apesar de autónoma da moral, a intersecta.


A distinção entre direito e moral não é linear. Se desde as eras primitivas, passando pela civilização greco-romana, culminando na época medieval, a moral foi sendo amplamente confundida e elevada à categoria jurídica. A Escola de Direito Natural Racionalista veio alterar esta tendência, separando o direito da moral, através de Fichte, Tomásio e Kant.
Os critérios de distinção entre direito e moral são vários, Kaufmann e o Prof. Mário Reis Marques optam pelo: critério de finalidade, critério de exterioridade, critério de heteronomia, critério de coercibilidade, critério de bilateralidade e critério de legalidade.


Segundo o critério de finalidade, o direito está ao serviço da sociedade, avaliando e determinando, a partir de uma escala de valores, de uma dimensão social, a vida comum dos indivíduos; a moral contempla os actos humanos a partir de uma dimensão pessoal, com vista ao aperfeiçoamento do indivíduo. Na situação em apreço, há uma valoração de dois valores constitucionalmente garantidos, o da expressão do desenvolvimento da personalidade da mulher e o da vida intra-uterina, artigo 24º, ainda que haja simultaneamente uma ponderação de valores, dos seus valores, por parte da mulher que aborta.


Já o critério de exterioridade diz-nos que o direito regula acções externas, pondo em relevo o aspecto exterior das condutas; moral regula os actos internos, prestando atenção à intenção, aos motivos do agente e da acção. Porém esta não é uma classificação dicotómica, mas sim gradativa: no direito valora-se o interior desde fora, na moral valora-se o exterior a partir do interior.


Também o critério da heteronomia não é absoluto. O direito é heterónomo porque tem origem numa vontade alheia, é imposto de fora. A moral é autónoma porque, sendo o homem a atribuir a si próprio as regras da sua acção, existe nela auto-legislação, uma auto-vinculação. No entanto, existe também uma vinculação autónoma do cidadão em relação ao direito, tanto mais numa matéria tão delicada como a da maternidade.


A coercibilidade é uma das características do direito, o incumprimento de normas jurídicas dá lugar à sanção, que é tarefa do Estado. As normas morais são incoercíveis, só a nível interno é que existem sanções, como disso é exemplo a culpa e o remorso.


Também na bilateralidade do aborto, na existência de uma mulher que interrompe voluntariamente uma gravidez e no feto abortado, e na própria sociedade que iria integrar o novo ser, reside um argumento para sustentar que estamos, preferencialmente, dentro da esfera jurídica. Há, no entanto, também neste critério uma dimensão moral, que diz respeito à obrigação moral que se dirige à mulher que aborta, enquanto ente individual.


Por fim, o critério da legalidade não se afigura como adoptável, já que tanto o direito como a moral pertencem ao mundo ético-jurídico.


Tendo em conta estes critérios, duas importantes correntes do pensamento jurídico têm diferente entendimento. Os jusnaturalistas entenderiam que o verdadeiro direito é aquele que se ajusta à moral, pelo que o aborto teria o tratamento jurídico que a moral indicasse. O positivismo jurídico aponta para uma total separação entre direito e moral, pelo que esta seria uma questão exclusivamente jurídica. O positivismo moderado de Hart admite uma incorporação, por parte do direito, de valores de índole moral.


A moral não paira em termos positivos sobre o direito. Pode não haver coincidência, e o direito possa abster-se de condenar algumas práticas consideradas imorais, como a prostituição. No caso do aborto, estamos no "espaço livre de direito", uma vez que há uma ausência de valoração, e não falta de regulamentação jurídica, que delimite legalmente as fronteiras dentro das quais o aborto "não é proibido, nem é permitido", o Código Penal limita-se a dizer que "não é punível". Nesta situação, não há uma colisão frontal com uma valoração religiosa, mas também não há uma equiparação da moral à esfera jurídica. É uma opção do direito, uma vez que esta é uma questão jurídica.


No entanto, o Direito traduz aquela parte do normativo social que tutela condutas humanas relevantes para a manutenção de uma convivência social, assente num saudável equilíbrio de interesses, daí que o Prof. Mário Reis Marques fale num mínimo ético, e Kaufmann fale num máximo ético, devido aos meios de coerção de que o direito dispõe e melhor garantem a sua eficácia.


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publicado por Margarida Balseiro Lopes às 19:17
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