"A vitória brilhará àquele que tímido ouse".
Agostinho da Silva
Mais de três décadas depois do 25 de Abril, não é dispiciendo fazer um primeiro balanço sobre a evolução da Imprensa Regional, em especial a que se tem publicado na Marinha Grande.
Um balanço necessariamente sumário, como antecâmara de um debate mais aprofundado que, porventura, nunca chegará a ser feito.
Se há “defeito” que possa ser diagnosticado no “modus vivendi” da capital vidreira, a incapacidade de reflectir sobre si própria não é, seguramente, o menor desses defeitos e reflectir sobre a história recente dos jornais locais não é exercício isento de riscos e que muitos queiram fazer, antes pelo contrário...
Aqueles que, como eu, olharam para o poder local com um misto de entusiasmo e apego à causa pública, foram ingénuos e não tardaram a compreender a responsabilidade dos orgãos de comunicação social locais no acompanhamento, controlo e denúncia do exercício de um poder que cedo deu mostras de ficar prisioneiro de interesses de caciques locais ou de corporações políticas, os quais nada tinham a ver com o interesse público. Antes pelo contrário, foram ficando cada vez mais prisioneiros desses interesses.
Neste contexto, a existência de jornais (e, mais tarde, também rádios) atentos e interventivos era condição essencial para que o poder local se sentisse observado e exposto perante aqueles que o iriam eleger – os eleitores. A qualidade da democracia local, o sentido crítico e vigilante desses eleitores tinha como pressuposto a existência de imprensa local capaz de cumprir a sua indeclinável função de guarda avançada da democracia e das suas instituições locais.
Compreendendo esse papel que estava reservado aos “media” locais, depressa os pontas de lança dos interesses políticos e económicos de muitos concelhos cerraram fileiras e apostaram na influência que o controlo desses “media” lhes iria permitir. Nuns casos, apostaram em orgãos de informação ja existentes, controlando-os, noutros seguiram uma estratégia um pouco mais inteligente – criaram os seus próprios orgão de informação (melhor, de propaganda), sob a forma de novos títulos ou de boletins municipais que o dinheiro dos contribuintes ia pagando. Em casos mais refinados e quando a publicidade municipal era fundamental à sobrevivência dos jornais, bastava orientar essa publicidade para orgão de informação que se prestassem a servir a auto-lisonja com que o poder tão bem convive.
Num e noutro caso, o propósito era o mesmo – impedir a existência de orgãos de comunicação isentos e dignificados, mesmo que à custa da subserviência e da mediocridade informativa para que, fatalmente, se caminharia.
Toda esta realidade passou pela Marinha Grande e serviu para, porfiadamente, alimentar uma espécie de “letargia revolucionária” que ia iludindo o eleitorado, tornando-o amorfo e sem sentido crítico.
Hoje, a Marinha Grande é um concelho sem projecto de futuro e sem capacidade de afirmação no contexto regional e nacional. É, também, uma terra com gritantes assimetrias sociais e económicas, refúgio de “vícios” e “chagas” sociais que já deviam ter merecido a reflexão e medidas de intervenção firme que as pudessem minimizar.
Em vez dessa reflexão, o que emerge é a indiferença e a incapacidade, mesmo quando a miséria humana é exposta com crueza como tão amiúde a encontramos nas ruas e avenidas da cidade.
Mas que importa esta preocupante realidade, se dela se alimentam interesses pessoais e de grupo que floresceram – e continuam a florescer - à custa do controlo dos “media” locais? Interesses que só na aparência se podem confundir com o interesse público já que, na verdade, é o interesse público que lhes está subordinado. Incluindo a comunicação social, esse quarto poder que se deixou homossexualizar numa estranha orgia de poder, por entre ruidosos silêncios de que uns poucos tiram prazer e muitos mais alimentam num foguetório ideológico feito de mediocridade e chavões já em desuso.
E porque a realidade merece que sobre ela reflictamos mais aprofundamente, não se esgotando num único artigo de análise e opinião, brevemente aqui estarei a escrever sobre o mesmo assunto.
Até breve,
Fernando Lopes